quinta-feira, agosto 17, 2006

Marcello Caetano - 100 anos

Hoje Marcello Caetano cumpriria cem anos. De toda a sua longa vida pública, incluída a cátedra que criou escola, fica-lhe indelevelmente associada a imagem do timoneiro maladroit da nave que sossobrou espectacularmente; daquele que, logrando dasagradar gregos e troianos, presidiu aos últimos estertores do Portugal euro-ultramarino. Não irei aqui alongar-me na sua avaliação: os amigos Misantropo e Combustões já sintetizaram, com a mestria habitual, a natureza humana e política do último Presidente do Conselho da Constituição de 1933.

Estou convencido de que Caetano poderia ter sido o governante modelo do regime parido pela abrilada, extirpados, claro está, os elementos estalinistas. Terá considerado a hipótese de inaugurar uma nova era a partir de um pronunciamento castrense que eliminasse a velha guarda salazariana e impusesse um novo rumo nacional? O seu comportamento nas vésperas do golpe, a atitude no dia do desastre, o refúgio e a rendição no Carmo, tudo permanece nas brumas...

Desvencilhar-se do “estorvo” que representava o Ultramar e aderir à CEE – com tudo o que isto comportava – parecem ter sido objectivos partilhados pelo antigo integralista (mais entourage) e pelos revolucionários da safra ’74. Se os objectivos eram os mesmos, os meios para os atingir, quero crer, teriam sido diferentes – não vejo Marcello Caetano, entre sorrisos e abraços, a atirar milhões de ultramarinos à imolação nas mãos de soviéticos e cia. Se bem recordo, o segundo governo Guterres utilizou dezanove antigos colaboradores do sucessor de Salazar em cargos variados, de presidentes de entidades estaduais à ministros de Estado. Socialistas, “centristas”, social-democratas... o Portugal “europeu” e moderninho, dos automóveis e telemóveis, diminuto e dependente... É fartar marcellice...

Talvez a melhor caracterização de Marcello Caetano – e do drama português que ele encarnou – tenha sido elaborada pelo próprio, ao substituir Salazar na Presidência do Conselho: acostumados há tanto tempo “a serem governados por um homem de génio”, os portugueses teriam de habituar-se ao governo de “um homem como os outros”.

E assim foi.

4 Comments:

At 2:55 da tarde, Blogger Paulo Cunha Porto said...

E assim hoi, com efeito, embora ele não perdesse a oportunidade de se tentar aproximar do Homem de génio, nomeadamente sublinhando as origens modestas vencidas pelos triunfos universitários de ambos.
Bem-regressado, Caro Euro-Ultramarino.

 
At 1:33 da manhã, Blogger Marcos Pinho de Escobar said...

Meu caro Paulo:

É verdade. No plano do discurso, já como exilado, fez, em grande medida, justiça a Salazar. No entanto, no plano da acção, mostrou-se bem diferente, e até oposto. Infelizmente.

Um forte abraço.

 
At 2:33 da manhã, Blogger Marcos Pinho de Escobar said...

Caro Visconde,
Acho que foi mais o contrário...
Abr.

 
At 6:57 da manhã, Blogger Jorge Arbusto Sr. said...

Aconselho "As minhas memórias de Marcello Caetano" de Nuno Rogeiro, no meu modesto blogue, quem quiser.

 

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