sexta-feira, outubro 06, 2006

Engenharia portuguesa no Rio da Prata

José Custódio de Sá e Faria, engenheiro militar português, teve uma larga e importante trajectória nos territórios que hoje constituem o Brasil, a Argentina e o Uruguay. Transferido à América na sequência do Tratado de Madri (1750), iniciou as suas tarefas como membro da Comissão Demarcadora que assentaria os limites entre as possessões ultramarinas dos reinos de Portugal e Espanha.

Mapa de demarcação de limites entre territórios portugueses e espanhóis na América do Sul

Um extraordinário preparo técnico e um grande talento para o desenho cartográfico levaram Gomes Freire de Andrade a nomear Sá e Faria como primeiro comissário da Terceira Partida Demarcadora (o estudo cartográfico da zona compreendida entre os rios Paraná e Paraguai, o plano da Colónia de Sacramento e o mapeamento do Salto Grande do Paraná são tarefas que o engenheiro luso realiza no período 1753-54).

O quase permanente estado de guerra entre as duas coroas ibéricas pela hegemonia na região leva Sá e Faria a abandonar o esquadro em favor da espada em inúmeras ocasiões, principalmente durante a conquista e ocupação da extensa região de São Pedro do Rio Grande (actual Rio Grande do Sul, Brasil) pelos exércitos espanhóis e as subsequentes tentativas de liberação. Após uma tentativa falhada de reconquista de Rio Grande Sá e Faria deu seguimento aos trabalhos de engenharia no Forte de Nossa Senhora de Igatimí, na fronteira com o Paraguai, e em várias obras de carácter militar no Rio de Janeiro, para onde havia sido convocado pelo conde de Azambuja.

Em 1777 a Espanha ocupa a ilha de Santa Catarina. José Custódio de Sá e Faria, enviado à pressa para comandar a defesa da fortificação, é derrotado pelas forças organizadas pelo Vice-Rei do Rio da Prata, Pedro de Ceballos. Confrontado com a possibilidade de ser executado por ordem do Marquês de Pombal - o todo-poderoso ministro de D. José I determinara que assim fossem tratados os oficiais portugueses que se rendessem -, Sá e Faria resolve desertar e oferecer seus serviços à Coroa d'Espanha, com a ressalva de que jamais actuaria contra o Reino de Portugal.

Com os bens confiscados e vendidos em hasta pública, o engenheiro militar inicia vida nova radicado em Buenos Aires e, em pouco tempo, torna-se o arquitecto mais importante da região. Paralelamente aos trabalhos cartográficos, Sá e Faria realiza uma verdadeira reurbanização da capital vice-reinal, assim como de Montevidéu, da Colónia do Sacramento, de Maldonado, etc.

Rapidamente designado director de obras públicas da cidade, a actividade de Sá e Faria foi febril: da correcção de deficiências urbanísticas e edilícias à construção (então grande novidade) de "casas redituantes" (prédios para arrendamento); da pavimentação de ruas e estudos sobre reservas minerais ao estabelecimento de aldeias na região patagónica; da construção de portos e docas às igrejas e catedrais.

Planos para "casas redituantes" em Buenos Aires

Planta, fachada e corte transversal da igreja de Maldonado (Uruguai)

Projecto para a igreja de São Carlos (Uruguai)

Em 1791, cansado e doente, Sá e Faria solicita a aposentação e retira-se para Luján, onde vem a falecer em 1792, após quinze anos de intenso trabalho no Rio da Prata. Está enterrado no Convento de Santo Domingo em Buenos Aires.

Algumas das obras de José Custódio de Sá e Faria que importa referir:

No Brasil:

Fortificações várias no Rio de Janeiro (1769); Forte de Nossa Senhora dos Prazeres de Igatimí (1774); fortificações da ilha de Santa Catarina (1763-1777); Igreja de Nossa Senhora da Conceição (Viamonte, 1763); Igreja da Nossa Senhora do Bom Jesus (Triunfo, 1765); paróquia de São José de Taquarí (1765); Igreja da Santa Cruz dos Militares (1a construcção: 1623); Igreja de São Bento (São Paulo); etc.

No Rio da Prata:

Construcção de prédio para a primeira gráfica em Buenos Aires (equipamento trazido de Córdoba); "casas redituantes", incl. as pertencentes à Universidade de Buenos Aires; várias obras na "Manzana de las Luces"; "Casa de Comedias" e edifício "Capitular"; Catedral de Buenos Aires (reconstrucção já iniciada por outro português: o mestre de obras Manuel Álvares da Rocha); a "Real Renta de Tabacos"; o Noviciado do Convento de São Francisco; o Armazém e Quartel do Retiro; a Praça de Touros de Montserrat; várias pontes e caminhos (Barracas, São Isidro, etc.); a Catedral de Montevidéu; o templo da vila de Guadalupe (Canelones, Uruguai); a Igreja Matriz de Maldonado (Uruguai); etc.

2 Comments:

At 7:58 da manhã, Blogger Unknown said...

Caro amigo, conheço um documento relativo às despezas tidas com a construção de duas igrejas e um celeiro, em Vila Franca de Xira, onde resido.
Acontece que o celeiro é da autoria arquitectónica de José Custódio de Sá e Faria, que começou por fazer o desenho de registo do local, em Agosto de 1747, tendo começado a obra em Novembro desse ano e terminado em Agosto de 1751. Nessa altura este arquitecto era Capitão de Infantaria com exercício de engenheiro na corte e província da Estremadura, ajudante número um dos regimentos da ordenança da guarnição Partidista da Academia Militar das Fortificações e Arquitecto da obra do Celeiro que a Reverenda Fábrica da Santa Igreja de Lisboa mandou fazer.
Fiquei muito entusiasmado em conhecer, com algum detalhe, o notável percurso deste homem depois da sua ida para o Brasil.
Adorei a informação aqui disponível e os desenhos da época.
Poderiamos trocar mais algumas informações?
Chamo-me Rui Cunha, sou arquitecto e tenho contacto electrónico arquicunha@gmail.com

 
At 9:22 da tarde, Blogger Unknown said...

consta também de ter feito a igreja de viamão e catedral de florianopolis capital de santa catarina e fez de traquari-rs a prim eira cidade planejado do rio grande do sul de origem açoriana

 

Enviar um comentário

<< Home